O homem de antigamente
cheirava a suor, a óleo queimado e sangue seco.
acordava cedo, levantava tijolo, matava porco,
dava conta de três filhos, uma mulher braba
e uma garrafa de pinga nas veias.
não chorava – rangia os dentes.
não escrevia poesia – era a própria poesia bruta,
sem rima, sem floreio.
hoje?
hoje ele se depila, se veste de algodão egípcio,
faz terapia pra lidar com a rejeição,
e pergunta: "está tudo bem entre nós?"
ele se desconstrói tanto que
se perde em cada pedaço de si.
anda em círculos no espelho, buscando um reflexo
que não ofenda, nem incomode.
a modernidade fez o favor de emasculá-lo,
chamou isso de progresso.
promoveu o sensível, o delicado, o emocional,
e deixou a virilidade na sarjeta,
junto com os cães vadios e os poetas bêbados.
o homem antigo?
foi chamado de tóxico, de opressor,
mas foi ele quem construiu os trilhos,
os prédios, os impérios e até os códigos morais
que agora querem destruir com hashtags.
as mulheres dizem que querem
homens sensíveis, que ouçam, que chorem,
mas ainda sonham com o lenhador suado,
com o gladiador coberto de cicatrizes,
com o bandido charmoso de filme antigo,
porque o instinto não tem pós-graduação.
o que temos agora é um impasse:
o passado com o punho cerrado
e o presente com as mãos unidas em prece.
o futuro?
provavelmente uma androginia apática,
um homem neutro, sem voz grossa,
sem cheiro, sem coragem de tomar um "não"
e ainda assim seguir em frente.
o macho está em extinção, meu caro.
não porque perdeu a guerra,
mas porque foi convencido de que lutar é errado.
morreu de culpa, de silêncio,
de tanto pedir desculpas por existir.
e quando tudo ruir,
porque vai ruir...
alguém vai ter que reconstruir do zero.
e adivinha só?
vai ser o último dos homens.
com calos nas mãos.
e um olhar que não vacila.
esse, sim, será amado.
mesmo odiado por todos os ideais modernos.
será amado como só o instinto sabe amar.
sem palavras.
sem permissão.
como um trovão que rasga o céu
e não pede desculpa pela tempestade.