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4 de junho de 2025

Auditório, Fé e Capital: Como Silvio Santos Redefiniu o Sucesso Popular, ou Entre o Shabat e o Show de Prêmios: O Legado Estratégico de Silvio Santos.


Silvio Santos – nascido Senor Abravanel, camelô carioca, judeu sefardita, herdeiro simbólico do financista bíblico-português Isaac Abravanel – partiu em 17 de agosto de 2024, mas sua silhueta continua tremulando no ar como letreiro de néon sobre a cultura popular brasileira.


Pensamento judaico, pulsação brasileira


Criado numa família que rezava em ladino e fazia do Shabat um exercício de frugalidade e união, Senor carregou três valores hebraicos para o palco nacional: chesed (solidariedade), chutzpah (ousadia) e tzedaká (caridade). A Teleton, maratona televisiva que ergueu hospitais e próteses para crianças com deficiência, concretizou o princípio de doar antes de pedir aplauso.

Sua fé jamais foi proselitista; era pragmática: “Minha religião é o público”, repetia. Esse pragmatismo dialoga com a ética rabínica do trabalho duro – “se não eu por mim, quem?” – mas temperado com a malandragem lírica do Rio de Janeiro.


Da banca de camelô ao Grupo Silvio Santos


A virada começou em 1958, quando comprou o Baú da Felicidade e trocou carnês por sonhos parcelados; dali nasceram SBT, Jequiti, Tele Sena e um portfólio que foi da cosmética à capitalização.

A lógica era simples e implacável: transforme audiência em moeda, depois transforme moeda em novas vitrines de audiência. Ao fundar o SBT em 1981, quebrou o quase-monopólio da Rede Globo, baixou o sarrafo de entrada para talentos periféricos e fez da grade um mosaico de auditórios onde o povo virava protagonista.


Importância social


Silvio reconfigurou a comunicação massiva em três frentes:

democratizou o microfone – ao colocar anônimos no centro do palco, antecipou a lógica participativa das redes sociais;

popularizou o marketing de prêmios, convertendo consumo em espetáculo;

institucionalizou o “business gospel” da TV filantrópica com o Teleton, captando bilhões em doações nas últimas três décadas.

Seus programas viraram espelhos de aspirações coletivas: alegria barata, chance de mudar de vida, humor de porta de rua – um reality show avant la lettre da brasilidade.


Legado e sucessão


O Grupo Silvio Santos sobrevive agora às seis filhas, profissionalizadas na gestão de mídia, cosméticos e capitalização. Consultorias de governance apontam o caso Abravanel como manual de sucessão familiar bem-amarrada em holdings e testamentos preventivos.

Mas o legado transcende balanços: ele cristalizou a ideia de que o brasileiro comum pode falar por si mesmo, vender seu peixe em horário nobre e, de quebra, financiar causas sociais.


A mensagem que fica


No epitáfio midiático de Silvio cabem três frases, quase mandamentos seculares:

Trabalhe como camelô, sonhe como bilionário.” – A pobreza de origem não limita o tamanho da ambição.

Quem ri vende; quem doa permanece.” – Humor é capital de giro, filantropia é reserva de valor.

Fale com o povo na língua do povo.” – Comunicação só é estratégica quando é simples.

Entre a ortodoxia do Shabat e o caos de auditório, Silvio Santos ensinou que fé pode ser motor de negócios, que entretenimento pode ser engenharia social, e que a gargalhada – esse ato tão humano – pode sustentar impérios tão sólidos quanto qualquer arranha-céu de concreto armado.





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