Escutai, pois, esta parábola, mas não com os ouvidos presos à letra, e sim com a alma sedenta pela clareza:
Um homem tinha dois filhos. Um, desejando experimentar o mundo com sede de autonomia, pediu sua parte da herança antes do tempo. Recebeu-a e partiu, confiante em seu próprio juízo. Gastou, caiu, perdeu-se. Mas foi nesta perda que se encontrou.
Não porque retornou à casa do pai, mas porque, no lodo da experiência, descobriu o que não aprenderia sob o teto da proteção. Ele saiu acreditando que a liberdade estava em possuir, mas voltou sabendo que a verdadeira liberdade está em compreender.
Sobre o significado da vida:
A vida não tem um sentido imposto de fora, como se um escriba cósmico tivesse cravado no pergaminho do universo um propósito inquestionável. A vida é um campo de cultivo. O solo é o corpo, a semente é a mente, e a água é o conhecimento. O fruto? A consciência.
Não há sentido da vida — há sentido na vida, e ele é forjado. Não se encontra o sentido: constrói-se.
Sobre as ideias absolutas e as verdades relativas:
O filho pródigo acreditava que a riqueza lhe garantiria o êxtase. Isso era sua verdade absoluta — até que a vida, com seus ventos, a relativizou.
As ideias absolutas são como molduras em torno de quadros ainda inacabados. Quando o homem as adota como dogmas, deixa de pintar. Quando as relativiza, começa a ver o todo. Assim, ideias relativas — como o valor da honra, da família, da liberdade — tornam-se absolutas quando nos esquecemos de questioná-las.
E isso é perigoso.
O pecado não é errar. O verdadeiro pecado é cristalizar o erro e chamá-lo de virtude.
Sobre crescer pelo empírico:
O pródigo não foi corrigido por parábolas nem mandamentos, mas pela fome. A dor não é inimiga — é pedagoga. A realidade ensina mais que a doutrina. Quem aprende com a própria carne grava o aprendizado no espírito.
Conhecimento empírico é o barro da sabedoria: sujo, denso, moldável. Quem teme se sujar jamais terá forma.
Sobre expandir a consciência:
A expansão da consciência não vem por gritar “Eu conheço Deus”, mas por sussurrar “Eu não me conheço ainda”. O pai da parábola não exigiu confissão, nem penitência. Apenas correu ao encontro, como quem reconhece a centelha de lucidez que, enfim, nasceu.
Expandir a consciência é aceitar que há algo além da certeza. Que a verdade se move. Que é preciso morrer em crenças para nascer em percepções mais elevadas. Que toda verdade de hoje pode ser a mentira de amanhã, e vice-versa.
Sobre viver a verdade e separar-se da mentira:
A mentira não está no outro — está no que escolhemos crer sem filtrar. Muitos vivem como o irmão mais velho da parábola: presos à obediência cega, mas incapazes de celebrar o arrependido. A mentira é viver uma moral sem alma, uma verdade sem compaixão.
Separar-se da mentira é o retorno à casa — não a casa de paredes, mas a casa interior. É o reconhecimento de que a verdade é um caminho, não um trono. E que só se vive de fato quando se aprende a desaprender.
Concluindo:
"Bem-aventurado o homem que perde tudo, porque finalmente poderá ver o que vale a pena manter. Bem-aventurado o filho que parte, pois só longe poderá descobrir o valor de estar perto. E bem-aventurado o pai que espera sem julgar, pois espelha o universo que aguarda, em silêncio, a lucidez de seus filhos.”
Assim digo: quem tem ouvidos para ouvir, ouça. Mas não com medo. Ouça com coragem.
Pois só quem desce ao abismo da dúvida, sobe à montanha da consciência.
E aí encontrará, não a resposta, mas o direito sagrado de continuar perguntando.
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